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Uma eleição mais racional?

A AMPLIAÇÃO DOS ESPAÇOS DA RAZÃO


A razão, como mecanismo para a tomada de decisões, está ampliando consideravelmente seus espaços junto aos segmentos sociais, inclusive nos setores populares, tradicionalmente conhecidos por agir intensamente sob o impacto das emoções. Os comportamentos mais racionais estariam relacionados a um cenário de modernidade, que aponta para um reordenamento na escala de valores, princípios e visões dos grupamentos sociais, a partir da saturação dos velhos discursos e mudanças significativas nos campos geopolítico e econômico mundiais.

O desmoronamento de importantes eixos que fizeram, por décadas a fio, o pensamento de parte significativa da humanidade, como a construção do edifício socialista, com sua fechada visão sobre a luta de classes, a integração geoeconômica entre países e blocos, e a homogeneização sócio-cultural dos povos, em função dos inputs fornecidos pelo aparato tecnológico da mídia massiva, estão entre os fatores que contribuem para a sedimentação de uma cultura racionalista.

As bases dessa cultura se apóiam, em um primeiro nível de análise, em mudanças ocorridas no campo individual. A pessoa, escondida no anonimato na massa, descobre que pode se transformar em cidadã. A cidadania deixa de ser o discurso demagógico das instituições políticas e ingressa nos repertórios mentais do indivíduo, passando a ser fator de conquista e meta desejada. Essa descoberta está intrinsecamente imbricada com a ampliação da "consciência do EU", que funciona como antinomia ao conceito do "NÓS coletivo", esteira da propaganda política e eixo principal da mistificação das massas.



O VOTO MAIS RACIONAL


A maior autonomia individual fortalece o desenvolvimento de uma postura que pode ser definida como a de auto-gestão técnica, pela qual os indivíduos passam a traçar seus rumos e a selecionar os meios, recursos e formas para atingir o seu intento. Rejeitam ou aceitam, com muitas restrições, as pressões autoritárias de um sistema de poder normativo, que geralmente vem de cima. Equivale a dizer que fogem dos "currais" psicológicos que enclausuram pensamentos e amedrontam espíritos. Seu conceito de legitimidade está embasado pela apropriação do heterogêneo, do inesperado e das diferenças.

O campo social se reparte num mosaico de multiplicidades e particularismos, abrindo-se o universo do discurso para a rebeldia das formas e rejeição a tudo que se assemelhe a totalizações. O desejo de posse e de status configura o quadro de decisões e os espaços privados são muito bem delineados, afastando-se dos espaços públicos. No campo moral, a aceitação universal de princípios sofre impactos, ampliando-se os espaços da espontaneidade, da criatividade e da individualidade. A tática se adapta aos territórios geoculturais e políticos, perdendo sua visão monopolista e se alimentando da seiva que começa a brotar dos segmentos jovens, dos grupos ecológicos, dos movimentos étnicos e da profusão de signos que se espraia nas ruas, nos shoppings-centers e nos corredores de cultura, esporte e lazer.

A transparência, a agilidade nos processos decisórios, as exigências sociais pela conservação do meio ambiente, a cobrança rigorosa aos representantes da sociedade nos parlamentos, as críticas contra a ineficiência das estruturas da administração pública, as mudanças e as novas interpretações para os dogmas religiosos, a derrocada de muitos mitos e a busca incessante da verdade contribuem para elaborar a moldura da racionalização dos processos e comportamentos humanos.

A esfera subjetiva, irrigada pelas paixões e por uma fértil liturgia emotiva, possui, ela mesma, seus elementos racionais. Há até quem fale na racionalização das emoções, pequeno crime que se comete contra os românticos e poetas. (Pode existir coisa mais racional que poesia concreta?) É claro que os atos racionais estão muito mais próximos ao domínio político, em função da crise intermitente que corrói as esperanças e destrói imagens. O eleitor brasileiro invade cada vez mais os limites da racionalidade. Com maior autonomia e mais descrente, ele estão assumindo sua condição de cidadão político. Um bem para ele e para o País.



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