Em artigo publicado hoje pelo jornal O Estado de S. Paulo, os cientistas políticos Marcelo Issa e Manoel Galdino afirmam que o projeto de lei propondo mudanças no sistema partidário e nas regras eleitorais, em exame no Congresso, é indecoroso e favorável à corrupção. Issa é também diretor-executivo da Transparência Partidária e Galdino diretor-executivo da Transparência Brasil.
Essas e outras dezenas de entidades enviaram uma carta ao presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em oposição ao Projeto de Lei nº 5.029/2019, na qual afirmam:
“Essa indecorosa proposta, que sequer constava da pauta da sessão, representa um dos maiores retrocessos das últimas décadas para transparência e integridade do sistema partidário brasileiro. De autoria do deputado Wilson Santiago (PTB-PB), o texto aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 4 veio à tona poucas horas antes de ser aprovado, sem qualquer análise ou debate mais aprofundado”.
O projeto, por exemplo, permitiria a utilização de qualquer sistema de gestão contábil para prestação das contas partidárias ao órgão de controle, em detrimento da utilização do Sistema de Prestação de Contas Anuais (SPCA), implementado pela Justiça Eleitoral em 2017. Com isso, ficaria inviável o controle das contas dos partidos, tanto pelos tribunais eleitorais, quanto pela sociedade, já que não haverá padrão nas contas dos partidos.
Além disso, dizem eles, a aplicação de multa pela desaprovação das contas somente ocorreria nos casos em que se comprovasse conduta dolosa (intencional), elemento que é difícil de ser verificado em atividades contábeis. Não obstante, essa alteração seria aplicada retroativamente em benefício de processos de prestação de contas que ainda não tenham transitado em julgado em todas as instâncias, funcionando como uma verdadeira anistia.
“A proposta também impediria a punição de partido ou candidato que inserisse dados incorretos nos sistemas de informação e publicação de contas de campanha”. Na prática, se traduz em verdadeira autorização para inserir dados falsos nos sistemas da Justiça Eleitoral que se demonstraram fundamentais nas últimas eleições para detecção das chamadas “candidaturas laranja”.
Além disso, o projeto autoriza o pagamento de advogados para políticos acusados de corrupção e para patrocínio de processos de “interesse indireto” do partido com recursos públicos. Permite também que pessoas físicas paguem despesas de campanha com advogados e contadores sem qualquer limite de valor e sem que esses gastos sejam incluídos na contabilidade partidária e no limite de gastos nominal das campanhas políticas. Essas previsões abrem ampla margem para caixa 2 e lavagem de dinheiro.
As demais alterações incluem, entre outros retrocessos:
1. Permitir que o Fundo Partidário seja utilizado para pagar passagens aéreas para qualquer pessoa e custear ações judiciais de controle de constitucionalidade;
2. Retirar as contas bancárias de partidos dos controles de PEP (pessoas politicamente expostas);
3. Isentar partidos de obrigações trabalhistas em relação a seus funcionários; Permitir que recursos do Fundo Partidário sejam transferidos para qualquer instituto privado, bastando que seja presidido pela Secretária da Mulher.
O texto ainda diminui as capacidades da Justiça Eleitoral, já que a impede de requerer aos partidos documentos emitidos pela administração pública ou por bancos, transfere a ela a gestão de dados dos filiados aos partidos, determina que ela só pode penalizar diretórios locais após comprovar que notificou o diretório nacional, e cria um novo recurso suspensivo que estimula a acumulação de processos no Tribunal Superior Eleitoral.
Ao final, dizem que “é fundamental acompanhar como os senadores votarão esse projeto. O voto favorável, nos termos atuais, é um voto contra a transparência e a integridade dos partidos políticos. Em última instância, é um voto favorável à corrupção”.
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