José Pastore*
O Brasil acaba de assistir a uma verdadeira revolução nos métodos de propaganda eleitoral. As ricas campanhas mantidas por verbas colossais e realizadas pelos megamarqueteiros deram lugar a informações sintéticas, pessoais e disseminadas pelas tecnologias do mundo digital.
No mundo do trabalho, igualmente, o modo de contratar e trabalhar está mudando a cada dia. A forma predominante de contratação ainda é em tempo integral e por prazo indeterminado, e assim deve continuar por muito tempo. Mas a incorporação de novas tecnologias nos processos produtivos faz crescer a cada dia as formas mais flexíveis de prestação de serviços, como é o caso do tempo parcial, da atividade autônoma, do trabalho intermitente, do teletrabalho, do trabalho por projeto, por demanda, por hora, etc.
Nos EUA, cerca de 1/3 das pessoas trabalha nessas modalidades. No Japão e na Europa a tendência é a mesma. O uso crescente dessas novas formas de trabalhar decorre não apenas da fragmentação do trabalho motivada pelas novas tecnologias, mas também do envelhecimento da força de trabalho, que leva os idosos a buscarem maneiras mais flexíveis de trabalhar. Essas transformações têm um profundo impacto no mundo sindical.
Durante mais de cem anos, os sindicatos defenderam salários e benefícios de empregados que trabalhavam no mesmo local, em empresas de grande porte, de forma continuada e previsível. Hoje, o que mais cresce é o trabalho realizado em ambientes pequenos, dispersos, voláteis e irregulares, onde os trabalhadores recebem por produção ou serviço realizado - e não por salário contratado. E, muitas vezes, as mesmas pessoas trabalham simultaneamente para vários clientes.
Será que os atuais sindicatos laborais conseguirão ajudar as pessoas que trabalham dessa forma? De que maneira poderão assegurar direitos e proteções num ambiente tão disperso, heterogêneo e volátil? Qual será o sentido da negociação e do contrato coletivos num mundo como este? Sem dúvida, os sindicatos laborais estão enfrentando enormes desafios que põem em risco a sua própria sobrevivência. E ninguém tem solução para tais desafios.
De forma lenta, gradual e isolada, começam a surgir algumas providências neste campo, em especial na Europa e nos EUA. Por exemplo, a IG Metal (metalúrgicos da Alemanha) criou uma plataforma digital para os freelancers, na qual orienta os seus representados sobre como cobrar pelos seus serviços e como reivindicar benefícios.
Na Inglaterra, igualmente, uma plataforma sindical vem sendo usada para facilitar a contratação e a defesa de direitos para atores do ramo do entretenimento. Na Itália, a Federação Metal-Mecânica (FIM) promove treinamentos para ensinar os trabalhadores autônomos a reivindicar e assegurar proteções. Nos EUA um sindicato de freelancers assinou um contrato coletivo com a Uber. Outros estão se preparando para retreinar os motoristas que, nesse setor, perderão seu emprego para os veículos autodirigíveis.
Em resumo, os sindicatos laborais estão sendo forçados a ter uma visão prospectiva que leve em conta as rápidas mudanças que ocorrem no mundo do trabalho. Mesmo assim, é provável que os trabalhadores das novas modalidades de trabalho venham a preferir, como fizeram os eleitores nesta campanha, comunicar-se diretamente com os tomadores de serviços por meio dos seus telefones celulares.
Não há dúvida: os sindicatos terão de se reinventar, especialmente no Brasil com o fim da contribuição sindical obrigatória.
*PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, É PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA FECOMERCIO-SP E MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS
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